
A rua está um inferno: ninguém é mais ninguém de verdade. Aceitem ou não. A pureza está em falta. Os mestres da ilusão, assassinados! É sinal de esperteza, prêmios e pompas, a chacota sobre cadáveres tristes. Isso aqui não tá legal. As sombras agora só aparecem via estágio, tudo com base em quantias sangrentas e imorais.
Qualquer jardim vale cada vez menos. Aliás, tá tudo tão cinza e febril: roga-se pela extinção da aurora e das magnólias!
Moços abdicam dos chapéus de outrora, como espelhos de uma face cega: que pobre vida! As moças repetem mantras dos teóricos mais vagabundos. O fato está mesmo consumado: declínio é a palavra do alto salão.
A música nem toca com desejo, nem toca. As pálpebras agitadas embrulham cenas lamentáveis: esqueletos cobertos por uma névoa idiota, em perfeita harmonia com os tons da banalidade, agora querem impor sua dinastia, seu reinado.
Digo e repito: isso aqui não tá legal. Ninguém se lembra das baladas de Clooney, Haymes e Crosby.
O sexo, como era antes, não sobreviveu. Tomou vários tiros à queima roupa. Restou apenas o cinismo do gozo de mentira.
E o escárnio da morbidez? A capa do jornal trouxe a imagem: rosto tomado por um sangue tenaz, mas derradeiro. Paletó desabotoado com marcas extravagantes de uma mão histérica. Tudo duro de constatar. Sabe-se lá como esse negócio vai terminar. Nem quero mais saber.
Não serei o último, suponho, mas tenho traçado meus planos para a posteridade. É hora de agir. Ou melhor, estou à disposição das autoridades mórbidas desta época. Prendam-me! Permitam-me esse desfecho! Do calabouço, certamente, entoarei várias páginas do meu mundo que entrou em desuso.